English French German Spain Italian Dutch Russian Portuguese Japanese Korean Arabic Chinese Simplified

Achados & Perdidos

No domingo chuvoso peguei a caixa de sapatos do velho guarda-roupa onde
guardamos, há muito tempo, pedaços de nossa inútil existência. A moeda de prata de dois mil réis; o anel imitando pedra preciosa que ela devolveu acabado o rápido namoro de duas semanas; um ingresso partido ao meio para a matinê do circo; o correio-elegante daquela paraguaia de olhos abertos e vivos suplicando
“no me olvides“ e que, dois dias depois desapareceu; o telefone da antiga namorada, escrito a lápis num papel marcado com beijos invisíveis; a carta do adeus, sempre fechada e que nunca tivemos coragem de abrir; o retrato
três por quatro esmaecido e borrado daquela que a gente lembra dolorosamente. Quase invisível, encontramos a promessa de um encontro escrita a lápis com letra fina e elegante de mulher no verso amarronzado de um maço de cigarros Ascott: “Amanhã, sem falta na praça Maria Pia“. Passeamos o dedo de leve nos objetos como se roçasse os pelos do braço na pele macia e perfumada que desapareceu nas brumas do tempo.
Fechamos a caixa e jogamos no incinerador do prédio. E não nos lembramos, infeliz ou infelizmente, se aquela frágil promessa de amor se cumpriu.

Juvenil de Souza promete nunca
mais abrir caixas de sapatos e nem o
velho e frágil coração. Mesmo porque
o que ele conta aqui é tudo mentira.

Próxima Crônica
Página Inicial